Coletânea
"FLOR DE NATAL Vol. II"
Venho
de longe, para lá de Trás-os-Montes...
-
Venho de longe, lá da terra, onde a chuva batia de mansinho no vidro da janela,
e onde às vezes, de manhã quando acordava, me deparava com uma paisagem deslumbrante,
toda coberta por um extenso e lindo manto branco de neve!...
Nos
beirais e nos ramos das árvores, existiam pendentes de gelo tão brilhantes, que
pareciam cristais, que lá foram colocados de propósito, para embelezarem as
nossas ruas e os caminhos!
Depois,
quando vinha o sol, os meus irmãos, eu e outros miúdos, saiamos para a rua,
para brincarmos, fazendo bonecos de neve, ou batalhas, atirando pequenas bolas
de neve uns aos outros, até cairmos em cima da camada branca e fofa, que cobria
as nossas ruas, também cobria com o seu manto branco, os telhados e até as
árvores que rodeavam a nossa linda aldeia cujo nome Cidadelha, remonta a tempos
muito antigos.
Com o passar dos dias frios de inverno, a neve
ia derretendo, transformando-se em gelo, que aproveitávamos para escorregar e
continuava a nossa brincadeira, até que derretia, desfazendo-se em pequenas gotas
de água, até desaparecer por completo, tal como a neve. Havia locais mais
sombrios, onde só a chuva derretia neve, surgindo de novo a verdejante e linda
paisagem, daquela pacata aldeia transmontana, cujos habitantes muito se orgulham
das suas festas, romarias e tradições ancestrais, que o seu povo continua ainda
a manter vivas a cada ano que passa, algumas são próprias desta pequena aldeia,
que fica apenas a dois quilómetros de Vila Pouca de Aguiar, sede do Concelho.
O
Natal era uma época festiva, de que as crianças gostavam e ainda gostam muito,
embora em nossa casa houvessem poucos recursos, pois eramos uma família pobre,
formada pelos meus pais, seis filhas e dois filhos.
Havia
tradições que se repetiam anualmente, algumas delas vou tentar descrevê-las.
A
minha mãe fazia sempre a ceia de Natal tradicional, da qual faziam parte as
batatas, bacalhau, couves, cebolas e ovos cozidos e regadas por um bom azeite.
A
minha mãe fazia sempre aletria doce polvilhada com canela, e fazia os fritos
tradicionais da nossa terra que eram as rabanadas, bolinhos de bacalhau,
bolinhos de abóbora e de abóbora gila, que, tal como os restantes legumes e
batatas, eramos cultivado por nós, na nossa terra, onde fazíamos agricultura de
subsistência e onde começámos todos a trabalhar ainda crianças.
Na
véspera de Natal, colocávamos os sapatos junto à lareira, onde os nossos pais,
durante a noite, depois de adormecermos, iam colocar um saquinho com confeitos
doces e coloridos, figos secos, alguns biscoitos e um pequeno lenço de assoar,
com desenhos infantis pintados no tecido, ficávamos todos muito felizes com as
prendinhas do Menino Jesus, era isso os nossos pais nos ensinavam, e em que nós
acreditávamos.
Ao
serão, brincávamos com uma pionita de quatro faces, cada face com uma letra, R
de raspa, T de tira, P de põe e D de deixa, onde íamos ganhando ou perdendo os
nossos doces, que no final restituíamos aos que perdiam.
O
nosso pai era um excelente contador de histórias antigas, e então sentado à
lareira, que de inverno estava sempre acesa, e nós, sentados uns ao seu colo,
ou agarrados ao seu pescoço e outros à sua volta, ouvíamos com toda a atenção,
as histórias ele contava.
Uma era a história do Dom Caio, eu caio, eu
caio; a do João Grilo, pobre grilo onde tu te meteste; a da Raposa e da
Cegonha, que se enganaram mutuamente com as papas no prato raso, ou dentro do
frasco; a do Touro Azul, um touro mágico amigo da princesa, a quem chamavam,
pobre Maria Suja, que era a minha preferida e muitas outras que ele nos contava
e que nós adorávamos ouvir.
Quando
crescemos passámos a ir ao baile da aldeia, mas infelizmente, fomos perdendo
algumas dessas tradições. Há outras, que em nossa casa, não dispensamos, a ceia
de Natal mantem-se, só acrescida de polvo cozido, porque o meu filho não gosta
de bacalhau, e de um pudim de leite condensado, receita da minha filha, e que
todos adoramos.
Tenho
muito boas lembranças dos Natais da minha infância, ainda hoje, é a festa anual
de que mais gosto, por ser a festa da união da família.
Para
festejar o Ano Novo, gostamos de bater tampas de panelas, para espantar o Ano
Velho, para o jantar, costumamos fazer petiscos, camarão, sapateira e outros
mariscos, saladas de polvo e ovas de bacalhau, comemos vários doces e frutos
secos, acompanhados por um bom vinho e champanhe, à meia noite, comemos as doze
passas, e pedimos os desejos, para o ano que está a começar e entre abraços e
beijinhos, desejamos a todos os familiares e amigos, um Feliz Ano Novo.